Pandemia: história da saúde e da doença no tempo presente

Setembro/2021

Marina Lemle | Blog de HCS-Manguinhos

Realizados conjuntamente e online pela primeira vez por causa da pandemia de covid 19, dois eventos temáticos – o 4º Encontro Luso-brasileiro de História da Medicina Tropical e o 2º Simpósio Nacional de História das Doenças e Artes de Curar – potencializaram seu alcance e atingiram um público recorde, muito maior e mais diverso do que o visto em edições anteriores, presenciais e separadas, dos mesmos eventos.

Com o tema Saúde planetária e desenvolvimento sustentável, a iniciativa conjunta aconteceu de 21 a 24 de junho de 2021 no canal de YouTube do Museu Histórico Prof. Carlos da Silva Lacaz, da Faculdade de Medicina da USP (FMUSP), e o seu sucesso animou os organizadores, que já vislumbram novas experiências, como a realização de eventos híbridos, que aproveitem o melhor de cada modalidade.

O evento sobre medicina tropical foi organizado pelos professores André Mota, do Museu Histórico da FMUSP, Jaime Benchimol, da Casa de Oswaldo Cruz (COC/Fiocruz), e Isabel Amaral, da Universidade Nova de Lisboa, Portugal; o sobre doenças e artes de curar, pelas professoras Tânia Salgado Pimenta e Dilene do Nascimento, da COC/Fiocruz.

Também pela internet, o Blog de HCS-Manguinhos conversou longamente com os historiadores André Mota e Tânia Salgado Pimenta sobre a experiência dos eventos virtuais conjuntos, sobre o que é fazer história no tempo presente e, mais especificamente, sobre a responsabilidade dos historiadores da saúde e da doença em plena pandemia, e diante do crescimento de negacionismos. Boa leitura!

Que fios condutores uniram o 4º Encontro Luso-brasileiro de História da Medicina Tropical e o 2º Simpósio Nacional de História das Doenças e Artes de Curar?

André Mota (Museu Histórico/FMUSP)

André Mota: Os dois eventos repercutem uma projeção da produção do campo historiográfico sobre as temáticas da história da medicina tropical, especialidade que dialoga muito com a produção da história da doença e das artes de curar, questão que vem sendo cada vez mais importante e um elo que não se pode perder de vista. Havia fios condutores que cruzavam os caminhos daqueles que vêm produzindo em torno dessas temáticas. A ideia foi fazer esse encontro mostrar a potência que a nossa área vem tentando traduzir nas últimas décadas. Achamos que poderia render algo muito produtivo, o que de fato ocorreu.

Em termos numéricos, o que se sabe?

André Mota: Foram quase quatro mil visualizações! Em cada mesa, havia cerca de 200 a 300 pessoas assistindo. Em eventos grandes, seria como quando a gente lota um teatro para assistir uma conferência, mas isso ocorreu nas mesas também, além das conferências, então tivemos esse público recorde. E além do público brasileiro, tivemos também um público fora do Brasil, como Espanha, Portugal, Argentina e México, que pôde acompanhar o debate para o qual, principalmente no Brasil, nossas instituições vêm contribuindo.

Foi possível notar diferenças de perfil de público dos eventos entre si e em relação a edições anteriores presenciais?

Tânia Salgado Pimenta (COC/Fiocruz)

Tânia Salgado Pimenta: O da medicina tropical é o quarto evento, ou seja, houve três antes, e o das doenças e arte de curar é o segundo – só teve um antes, na USP, que teve um público bastante grande. Este evento agora, com os dois juntos e pelo meio virtual, teve um público muito maior e mais diverso. Pudemos usar as estruturas da USP e da COC, o que possibilitou o evento ser totalmente gratuito, tanto para aqueles que apresentaram trabalhos, quanto para aqueles que participaram como ouvintes e os que assistiram de forma avulsa. Sem dúvida alguma, foi muito mais amplo e atingiu um público muito maior nessa forma virtual. É claro que se perde um pouco nas relações acadêmicas, aquela conversa depois das apresentações que às vezes pode resultar num projeto em comum, mas teve uma interação muito maior do público. Mesmo não estando inscritas, as pessoas podiam interagir pelo chat do YouTube. E está tudo disponível no YouTube do Museu Histórico da FMUSP, então os eventos ainda estão repercutindo!

Foi mais fácil ou mais difícil de organizar? Mais caro ou mais barato?

Tânia Salgado Pimenta: Mais barato, com certeza. Não teve o custo das passagens e diárias aos conferencistas, e contamos com a ajuda dos alunos do Programa de Pós-Graduação em História da Ciência e da Saúde (PPGHCS/COC/Fiocruz) e da Pós-graduação em Medicina Preventiva da Faculdade de Medicina da USP, assim como da estrutura de ambas, o que permitiu que fosse um evento gratuito. Mais fácil já não sei (risos), porque tivemos que nos apropriar de uma série de questões tecnológicas novas para nós. Especificamente para o 2º Simpósio Nacional de História das Doenças e Artes de Curar, o que eu e a professora Dilene do Nascimento fizemos foi instigar grupos que já conhecíamos a propor mesas e comunicações.

Num cenário pós-pandemia, com o retorno às atividades acadêmicas presenciais, como pensam os próximos eventos?

André Mota: Essas experiências estão sendo muito enriquecedoras e desafiadoras. Quando fazemos em encontro presencial, temos aquilo que a Tânia chamou atenção, que é o tipo de encontro que um evento online não nos permite. Então precisamos pensar sobre isso, talvez fazer algo híbrido, abrindo um canal, como fizemos, para uma pessoa que esteja num lugar muito longe de onde o evento está sendo sediado, e que às vezes não tem recursos para fazer esse deslocamento e permanecer no evento de forma presencial, possa ter garantido esse contato, essa conversa, esse diálogo. Garantir, de maneira cada vez mais democratizante, que todos possam ter acesso a um debate tão importante e tão elevado como foi o nosso, é algo muito positivo, então devemos pensar nisso.

O tema central dos eventos conjugados foi Saúde planetária e desenvolvimento sustentável. Qual o estado da arte da produção historiográfica em torno do conceito de “saúde planetária”?

André Mota: Essa tomada de decisão sobre o tema central está ligada às novas demandas que as agências internacionais vêm nos colocando. Diante da situação de desequilíbrio climático, das demandas e desafios da questão de proteção do meio ambiente, essa discussão vem sendo necessária para o mundo, e especialmente para esse momento no Brasil, vivido de maneira muito particular. Achamos que “saúde planetária” seria um eixo propulsor para que todos os trabalhos, mesmo aqueles que não trouxessem diretamente a temática, de alguma maneira pudessem se cruzar.

Além disso, podermos ter na sessão de abertura a participação de Nisia Trindade Lima (presidente da Fiocruz, socióloga, COC) repercute, de forma muito positiva e afirmativa, um certo movimento de resistência e discussão política que envolvem a temática. A ideia foi capturar uma temática importante, mas ainda tímida entre nós, historiadores. Porém, aqueles que estiveram à frente e puderam fazer suas conferências, como Marcos Cueto (editor-científico da revista HCS-Manguinhos, COC) e Magali Romero Sá (COC), trouxeram um enlevo, uma projeção e uma necessidade de que sejamos mais afinados e preocupados com essa temática, e de maior comunicação dela. As pessoas que trouxeram o debate, principalmente através das conferências, alinhavaram muito bem quais são as preocupações que rondam nosso campo de estudos.

Poderia citar alguns temas que se destacaram?

Tânia Salgado Pimenta: A questão das pandemias, epidemias e algumas doenças e grupos negligenciados, saúde em locais específicos, como em países na América do Sul ou na Paraíba. E também houve mesas sobre memória, patrimônio e museus, gênero, meio ambiente e práticas de saúde, entre outras com temas mais específicos.

E as mesas continuaram a repercutir depois?

André Mota: Acho que as pessoas estão bastante preocupadas com esses temas a partir da vivência da realidade. Pandemia, endemias que assolam as nossas vidas, formas de organização social que colocam grupos mais vulneráveis que outros, como negros e mulheres, lugares mais pobres e desprovidos de condições de saúde, isso tudo chamou bem a atenção do nosso público, que está mais sensível a essas temáticas.

O que poderiam destacar sobre as participações nos eventos?

Tânia Salgado Pimenta: Da Casa de Oswaldo Cruz, tivemos eu, Dilene do Nascimento e Jaime Benchimol, como organizadores, Magali Romero Sá e Marcos Cueto, como convidados, e Anna Beatriz de Sá Almeida. Mas quero destacar em especial a participação dos pesquisadores jovens da Casa – pós-docs, doutorandos e mestrandos do PPGHCS e de egressos que já são professores e pesquisadores em outros lugares. Além da apresentação de trabalhos, boa parte dos alunos também participou dando suporte, vestiram a camisa do evento e atuaram como monitores.

André Mota: De São Paulo também tivemos dezenas de pós-graduandos e pós-docs participando. Ver essa mocidade que está chegando foi muito gratificante para nós. Sobre a Casa de Oswaldo Cruz, ela é um farol para nós que estamos nos outros estados, a gente aprende muito ela, e ter essa presença tão marcante no evento foi muito importante para nós todos, porque estamos sempre muito juntos, foi síntese. 

O que mudou no trabalho do historiador com a pandemia?

Tânia Salgado Pimenta: O historiador sempre vai fazer as questões para o passado a partir do presente, mas com a pandemia isso se tornou mais agudo, principalmente para quem trabalha com história da saúde. Agora o tempo todo estamos fazendo reflexões sobre o passado e trazendo para o presente – as questões vão do presente para o passado e o que estudamos do passado também nos ajuda a refletir sobre as questões atuais. Isso tem ficado cada vez mais forte na reflexão sobre o fazer historiográfico. E também os historiadores têm recebido uma demanda da sociedade para falar sobre isso.

André Mota: Concordo. Acho que nessa questão do que a gente chama de “história do tempo presente”, os historiadores têm alguma proximidade com os poetas, quando sentem uma certa expectativa do que vem sendo construído, dos encaminhamentos para o futuro. A pandemia exigiu dos historiadores uma leitura de si mesmos. De que maneira estamos interpretando o presente? Não tivemos o tempo de reflexão, tivemos que sentar e produzir dentro da pandemia sobre ela, o que trouxe um vento novo, que é o historiador pensando o seu próprio tempo e dentro de uma grande problemática. E senti algo muito forte: de repente, descobriram os historiadores da saúde, e os temas da saúde e da medicina. Outros campos historiográficos tentam querer se meter em falar e parece que erram um pouco justamente porque não nos leram.

Que tipo de erro vocês observaram?

André Mota: Vemos um certo equívoco, um desconhecimento de temáticas e questões das quais o campo da história da saúde já trabalhou de forma muito profunda. Não dá para se colocar de forma muito simplista. O que é uma pandemia e como é produzida? Vemos pessoas tentando falar da pandemia como se ela se reduzisse a um evento biológico. A história da saúde, através dos seus pesquisadores e trabalhos, já demonstrou a complexidade do viver pandêmico e da própria forma como a pandemia vai sendo estruturada inclusive do ponto de vista das suas definições biológicas. Esse aprendizado e essa sensibilidade faltaram em algumas falas, por mais que a intenção fosse boa. Muitas vezes queriam discutir o que estava acontecendo com a sociedade, mas considerando a pandemia já como um evento biológico dado, e não como algo tão complexo que explica este mesmo viver social. Nosso campo precisa ser olhado e estudado para que a gente não caia em simplismos e armadilhas que um olhar sem este conhecimento acaba produzindo. A pandemia não é uma coisa dada. O campo da história da saúde veio para mostrar que há uma expertise a se olhar. Tem um olhar por dentro, uma epistemologia que precisa ser melhor compreendida. Tivemos que repercutir uma visão que já tínhamos construído há décadas, e que mostra o nosso campo com muita potência, um campo criativo, com vontade, que tem uma velha guarda e também tem uma moçada que está chegando com seus estudos e propostas, então também foi uma redescoberta de nós mesmos. A gente se sente mais próximos inclusive uns dos outros, como eu com a Tânia e o pessoal da organização desse evento. 

Tânia Salgado Pimenta: E às vezes algumas pessoas trazem a complexidade da pandemia como se estivessem descobrindo a pólvora, quando na verdade a gente já vem trabalhando essa questão faz tempo.

Como seria essa visão mais complexa da pandemia, para além do fenômeno biológico?

André Mota: Já estudamos outras pandemias. Já entendemos aquilo que é permanência e aquilo que é ruptura desse viver pandêmico. Já compreendemos como a organização do sistema é a própria produtora dos eventos pandêmicos. Uma pandemia não vem do nada, ela vem de uma estruturação social, econômica, cultural, política. Como as epidemias e pandemias são produzidas e como são pensadas, como são enfrentadas por cada sociedade dentro do seu próprio tempo. Tudo isso já foi estudado. Saber diferenciar que aids não é igual a covid 19, mesmo sendo uma vivência epidêmica e pandêmica. Há muitas décadas e em muitos trabalhos a história da saúde e da doença vem fazendo este movimento de aproximação e por outro lado nos coloca distantes exatamente porque é outra coisa, em outro tempo e lugar. Algumas pessoas querem falar aquilo que já foi falado, é algo conhecido e dado. Estamos em outro patamar de discussão. Voltar a determinadas discussões com um ar de que seria uma grande novidade demonstra o desconhecimento de um campo que vem se esforçando para trazer essas explicações e possibilitar que a gente caminhe em outro sentido, que dê um push em outra direção, e não voltarmos a discussões que já foram feitas e de maneira muito mais profunda e qualificada. É um aprendizado para todo mundo.

Tânia Salgado Pimenta: O que queremos chamar atenção é da necessidade do diálogo do campo da história da saúde e da ciência com o restante da historiografia. Precisamos ter mais visibilidade.

E como foi interagir com os leigos?

Tânia Salgado Pimenta: Foi bacana, o contato com o público sempre é enriquecedor, e faz parte do trabalho do historiador e da ideia de história pública.

André Mota: Quanto mais leigos estiverem interessados em nos ouvir, mais poderemos levar um conhecimento que traga reflexões sobre a sua própria concepção de saúde e doença e de produção de saúde e produção de doença. O público em geral inclusive traz surpresas que a gente não espera e que nossos trabalhos não puderam responder.

Pode dar um exemplo de pergunta de difícil resposta?

André Mota: A saúde é um direito de todos? Essa é uma grande pergunta, e tão simples, aparentemente de fácil resposta, e de tão difícil compreensão para pessoas que vivem em determinadas regiões, fazem parte de determinados grupos, convivem em determinadas situações. Se a saúde é um direito de todos, como diz a nossa Constituição, por que tantas pessoas morreram de covid? Por que grande parte da população brasileira não tem saneamento básico, água tratada, vive nas ruas? Essa questão exige de nós trazer todo um mundo complexo que os estudos vêm fazendo. Se olharmos para a escravidão, a Primeira República, os dias de hoje, vamos encontrar essa problemática. E por que ela permanece? Porque se a gente consegue botar na lei que a saúde é direito de todos, mas ela não é de fato, existe entre o direito e o fato um mundo histórico, que é a nossa própria construção do mundo social.

Tânia Salgado Pimenta: Esse é um ótimo exemplo. Trabalho com saúde e escravidão, e uma das reflexões que a gente se coloca no momento é que o grupo mais atingido pelas epidemias no século XIX, como cólera, eram os africanos e os descendentes de africanos, escravizados e libertos. E agora? Os mais atingidos pela covid são os afrodescendentes. Como a gente explica essa permanência num tempo tão grande, apesar de tantas mudanças políticas e econômicas? Socialmente, esse grupo continua mais vulnerável e suscetível a morrer.

E o que dizer sobre pessoas que não querem tomar vacina?

Tânia Salgado Pimenta: A impressão que tenho é que isso acontece mais nos Estados Unidos. Aqui as pessoas querem mais é escolher a vacina, mas querem vacina.

André Mota: Dilene do Nascimento sempre trouxe essa discussão na história da vacinação, e Gilberto Hochman aborda um ponto interessante, a construção de cultura vacinal a partir da varíola, e como isso se internalizou no viver social brasileiro com muito mais potência do que o negacionismo à vacina. Estamos vivendo uma crise do próprio neoliberalismo que é a crise do individualismo. A vacinação nos obriga a pensar o coletivo: eu me vacino por mim, mas também pelas outras pessoas O mote do negacionismo é “eu faço aquilo que eu quero”, sem pensar o coletivo. Dentro de uma pandemia, isso está trazendo resultados terríveis. O Brasil é um dos piores exemplos do mundo, e os Estados Unidos também. Na Flórida, o aumento recente de número de mortes foi quase totalmente de pessoas que não quiseram se vacinar. Então essa discussão do coletivo e da democracia atrelada à questão da vacinação é muito fundamental. A cultura vacínica que Hochman chama atenção se aprofunda muito com a redemocratização do Brasil. A ideia de que a saúde é um direito de todos e a vacinação, portanto, um direito coletivo nasce com o SUS. O que vem chegando aqui é fruto de uma grande crise neoliberal e do atual governo, que até muito pouco tempo vinha lutando contra o processo de vacinação. Não vai restar dúvidas para a história e para os campos do direito e político que muitas pessoas que morreram porque não se vacinaram caíram num discurso negacionista, individualista.

E diante disso, qual é o papel do historiador e dos divulgadores de ciência?

Tânia Salgado Pimenta: Há uma demanda da sociedade em relação aos historiadores para se colocarem em relação à história da saúde, das doenças e das epidemias, mas também tem uma necessidade de os próprios historiadores se colocarem. Existem esses dois sentidos. A gente tem sido bombardeada com tantas lives e mesas virtuais sobre essas questões, talvez se precise de uma organização, de uma racionalidade maior sobre isso, mas quem tiver acesso à internet e interesse sobre o tema está tudo bem dado, é só procurar que os historiadores não param de falar sobre o assunto. A questão também é sair da bolha e chegar às pessoas que não estão procurando, mas que precisam ser informadas e levadas a refletir. Essa é uma questão para se pensar junto com o pessoal da comunicação. Os historiadores, sozinhos, não conseguem furar essa bolha. 

André Mota: É uma responsabilidade nossa muito grande. Vivemos num país onde sempre houve esse problema – aquilo que chega ou não ao público – mas que se aprofundou muito na sua atualidade. O sentido daquilo que a gente fala, para que não seja nem uma fala esvaziada de público, mas que também as pessoas não comecem a falar porque se sentem “estrelas”. A nossa função precisa ser cada vez mais pública, coletiva e democrática. A tentativa de furar a bolha, como a Tânia disse, para tentar dialogar com aquele que ainda não nos ouviu, e que ao nos ouvir pode passar a refletir o seu mundo de uma outra forma. A invisibilidade dos negros no nosso país também é a invisibilidade da história deles. Quando pensam a epidemia, não refletem que foram os escravos os que mais morreram nas epidemias passadas. Então essa questão da história pública, de termos o objetivo de enriquecer o debate e a reflexão de todas as formas possíveis e em todos os grupos possíveis, acho que vai ser muito imperativo, no lugar de ser estrela, do brilho, que é muito característico do nosso mundo acadêmico. Vamos ter que repensar nosso lugar de intelectual, quando a nossa população é analfabeta e não consegue refletir sobre a sua própria história. Precisamos abrir a janela e dizer: gente, nosso trabalho é outro, nossa função é outra! Esse momento está nos chamando a essa reflexão e nos balançar e nos fazer mudar. Espero que a gente mude.

Tânia Salgado Pimenta: É importante lembrar, que mesmo atendendo a esse chamado da divulgação científica, nos chamam para levar informação, como se só a informação fosse resolver o problema. O que queremos é levar questões para que as pessoas reflitam sobre, e não como se as pessoas fossem totalmente ignorantes e idiotas. Mas tem pessoas que trabalham com divulgação científica que tratam o público assim.

André Mota: As pessoas não são um repositório vazio e o passado não dá lições. Nós estudamos o passado para poder refletir sobre o presente. Os jornais de 1918 já diziam que era preciso lavar as mãos para se proteger das epidemias, e hoje muitas pessoas morreram de covid 19 por não terem lavado as mãos, mas não porque não aprenderam, e sim porque não tinham água. Esse é o ponto, essa é a reflexão que queremos trazer para podermos refletir sobre a nossa vida para poder mudar a estrutura em que estamos inseridos.

Acesse as conferências e mesas dos eventos no canal de YouTube do Museu Histórico Prof. Carlos da Silva Lacaz (FMUSP)

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Mudanças climáticas, poluição, aquecimento global e Antropoceno são termos que também podem ser usados por historiadores. Warwick Anderson e James Dunk, pesquisadores do Departamento de História da Universidade de Sydney, explicam o que é a saúde planetária em entrevista a Marcos Cueto, editor de HCS-Manguinhos

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