Abril/2014
Por sugestão do professor Luiz Antonio de Castro-Santos, o blog de História, Ciências, Saúde – Manguinhos abre um espaço de discussão, críticas e comentários sobre as normas que regulam as pesquisas no Brasil hoje. Ele escreveu um texto para incitar o debate no blog e uma carta aos editores da revista. Estamos publicando contribuições ao debate.
Anonimato para quê?
Luciano Mendes de Faria Filho *
Concordo plenamente com a carta do professor Luiz Antônio, tanto no que se refere à questão de fundo que coloca, quanto à convocação que faz à comunidade científica para que discuta com mais profundidade – e propriedade – o tema da ética na pesquisa. E, mais, as questões que traz para o debate não deveriam mobilizar apenas aos cientistas das “humanidades”, mas todos os cientistas do país, já que o que está em jogo, em última instância, é o próprio sentido do trabalho intelectual.
Gostaria, ainda, de desdobrar um argumento esboçado pelo professor Luiz Antônio: as implicações políticas de nossos procedimentos éticos na pesquisa. Acompanho, sobretudo no campo da educação, mas não apenas, a aplicação restritiva da ideia de que devemos não apenas garantir, mas também incentivar, o anonimato de nossos depoentes. Ora, isso, em algumas situações, torna não apenas ininteligíveis as nossas pesquisas, como também apresenta sérias implicações políticas. De um modo geral, o anonimato em nossas pesquisas em ciências humanas mais garante o apagamento da autoria, do pensamento e da expressão dos setores populares do que a fidedignidade dos dados.
Ninguém faz entrevista com intelectuais ou políticos famosos e propõe o anonimato! Se em algumas circunstâncias especiais o anonimato se torna necessário, em muitas outras ele pode significar uma atualização de uma cultura política profundamente autoritária, que não suporta a contestação das posições estabelecidas, e, mesmo, o não reconhecimento dos sujeitos que, muitas vezes, as próprias pesquisas pretendem fortalecer.
Ou seja, apenas aparentemente o tema da ética na pesquisa interessa apenas aos pesquisadores. E, também por isso, nada autoriza que uma ou outra comunidade de pesquisa, por mais brilhante e importante que seja, imponha às demais os princípios e procedimentos éticos de pesquisa que seus praticantes consideram pertinentes e adequados, como ocorre hoje no Brasil.
* Luciano Mendes de Faria Filho é professor titular da Faculdade de Educação da Universidade Federal de Minas Gerais e Diretor do Centro de Pesquisa, Memória e Documentação da universidade.
Contribuições para o debate:
Vamos discutir os comitês de ética na pesquisa?
Por sugestão do professor Luiz Antonio de Castro-Santos, o blog de História, Ciências, Saúde – Manguinhos abre um espaço de discussão, críticas e comentários sobre as normas que regulam as pesquisas no Brasil hoje em dia.
Uma crítica aos atuais comitês de ética na pesquisa no Brasil
Carta de Luiz Antonio de Castro-Santos aos editores de HCS-Manguinhos
Luiz Fernando Dias Duarte: cientistas sociais estão presos em camisa de força burocrática
Para antropólogo, submissão das pesquisas em ciências sociais e humanas à lógica biomédica é descabida e autoritária.
Maurício Reinert: ‘O Brasil precisa de mais, e não menos, pesquisa’
Para professor de Administração da Universidade Estadual de Maringá, submissão de pesquisas em ciências sociais ao Conep fere autonomia universitária
Flavio Edler: comitês de ética inibem liberdade de pesquisa
Historiador compara sanha reguladora à Real Mesa Censória dos tempos coloniais.
Como citar este post [ISO 690/2010]:
Anonimato para quê?. Blog de História, Ciências, Saúde – Manguinhos. [viewed 23 April 2014]. Available from: http://www.revistahcsm.coc.fiocruz.br/Anonimato-para-que/