Abril 2013
No Brasil, após Primeira Guerra Mundial, ideias eugênicas passaram a ser difundidas entre uma elite intelectual e política que entusiasmou-se em construir uma nova identidade para o homem brasileiro, branqueando-o aos poucos com a fusão de novos imigrantes europeus. O eugenista de maior proeminência no Brasil foi o médico e escritor paulista Renato Kehl (1889-1974), que foi diretor da Indústria Química e Farmacêutica Bayer do Brasil. Entre 1917 e 1940, ele assumiu a propaganda eugênica como missão política e intelectual, o que lhe rendeu o título de ‘pai da eugenia no Brasil’.
Conceitos extremados de ‘eugenia negativa’, que emergiam no final dos anos 1920 em países como a Alemanha e os EUA, sugeriam impedir a reprodução de sujeitos tidos como inaptos. O movimento pela ‘higiene racial’, criado durante a República de Weimar (1918-1933), formou as bases ideológicas e institucionais que constituiriam parte do imaginário arianista e das ideias eugênicas que seriam desenvolvidas durante o Terceiro Reich (1933-1945). No Brasil, Kehl foi um dos mais entusiastas do projeto arianista proposto pelo governo alemão e demonstraria suas posições favoráveis à política eugênica nazista mais claramente em 1935.
Assumindo o radical determinismo biológico, Kehl distanciou-se dos preceitos da medicina social. Para ele, “enquanto o problema da regeneração humana não for encarado sob o ponto de vista biológico”, não deixariam de existir “os contrastes sociais e individuais, as crises e ameaças à paz na família, na sociedade e entre as nações”.
A eugenia mais radical teve poucos adeptos no Brasil. Mais sucesso fez o sociólogo e ensaísta Gilberto Freyre (1933), com o livro Casa Grande e senzala, que apresenta uma leitura positiva da formação racial do país. Outros intelectuais como Roquette-Pinto e Fróes da Fonseca fizeram coro contra o racismo biológico durante o Primeiro Congresso Brasileiro de Eugenia. Era maior e crescente o número de intelectuais que reafirmavam a identidade mestiça como um valor positivo da formação nacional. Para eles, os ‘problemas brasileiros’ não estavam relacionados à questão racial, mas sim aos problemas de ordem política e social, como a instrução do povo, a melhoria das condições alimentares e o combate às doenças e endemias. Na história intelectual brasileira, Kehl ficou obscuro.
No artigo “Eugenia ‘negativa’, psiquiatria e catolicismo: embates em torno da esterilização eugênica no Brasil”, publicado na revista História, Ciências, Saúde – Manguinhos (v.20, n.1), os pesquisadores Robert Wegner, professor do Programa de Pós-graduação em História das Ciências e da Saúde da Casa de Oswaldo Cruz/Fiocruz, e Vanderlei Sebastião de Souza, pós-doutorando na Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca/Fiocruz, analisam o projeto eugênico defendido por Renato Kehl a partir do final dos anos 1920 e o seu diálogo com um grupo de psiquiatras brasileiros que, no início da década de 1930, aproximaram-se da chamada eugenia negativa.
Entusiasmados com as pesquisas e a aplicação de medidas eugênicas em países como os EUA e a Alemanha, autores como Ernani Lopes, Ignácio da Cunha Lopes, Alberto Farani e Antonio Carlos Pacheco e Silva elegeram a religião católica como empecilho para que o Brasil pudesse seguir caminho semelhante, especialmente quanto à resistência à implantação da esterilização dos ditos ‘degenerados’ que passara a vigorar na Alemanha em 1934. O artigo mapeia as diferentes estratégias propostas pelos autores para dialogar com a Igreja católica.
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Dossiê Brasil – Alemanha: relações médico-científicas