A cultura científica

Maio/2015

As expectativas da sociedade a respeito da ciência variam historicamente. No artigo Variações sobre a “cultura científica” em quatro autores brasileiros, que está nesta edição de HCS-Manguinhos (vol. 22, n. 2 abril-junho 2015), Marina Assis Fonseca e Bernardo Jefferson de Oliveira, da Universidade Federal de Viçosa, analisam visões expressas por quatro autores influentes nas políticas científicas e educacionais em diferentes momentos: Miguel Ozorio de Almeida, Anísio Teixeira, Maurício Rocha e Silva e Carlos Vogt.

“Procuramos contrapor a tendência de tratar a cultura científica como um conceito unívoco, ou seja, como se ela fosse igual em toda parte e em qualquer época. Nosso objetivo é evidenciar a transformação de visões sobre a ciência e seu papel na sociedade, mostrando distintas perspectivas e seus contextos, a fim de resgatar a dimensão histórica do processo de construção do papel que a ciência desempenha em nossa época”, afirmam os autores do artigo.

Miguel Ozorio de Almeida

Miguel Ozorio de Almeida (1890-1953) era fisiologista. Foi um dos principais fundadores da Academia Brasileira de Ciências, que presidiu de 1929 a 1931. Foi também presidente da Academia Brasileira de Letras e diretor do Laboratório de Fisiologia do Instituto Oswaldo Cruz.

Para Ozorio de Almeida, o atraso na cultura científica estava ligado ao modelo de saber que as inteligências nacionais haviam perseguido – e não, como sugeriam alguns de seus contemporâneos, na falta de “capacidade da raça”. O problema residiria na ênfase no conhecimento utilitário, em detrimento do investimento na ciência pura, do qual dependia. Além disso, na rara ciência pura existente, o modelo era o da história natural, e não da física, matemática ou das ciências experimentais.

Anísio Teixeira

Anísio Spínola Teixeira (1900-1971), natural de Catité, Bahia, tornou-se secretário da Educação do Rio de Janeiro em 1931 e realizou ampla reforma na rede de ensino, do primário ao superior. Foi idealizador e reitor da Universidade do Distrito Federal no início dos anos 1930. Na década de 1950, esteve à frente da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) e, no início dos anos 1960, da criação da Universidade de Brasília (UnB), da qual foi reitor em 1963 e 1964. Sua concepção de cultura científica esteve presente nas discussões e no delineamento de boa parte destas iniciativas.

Seus escritos tratam, principalmente, de sistemas de ensino, educação pública, democratização, pesquisa em educação, ensino superior e formação de professores. Ele procurava fundamentar de forma clara uma série de propostas de transformação da realidade educacional brasileira.

Maurício Rocha e Silva 

Maurício Rocha e Silva (1910-1983) nasceu no Rio de Janeiro, onde formou-se em Medicina, mas fez carreira em São Paulo. Entre 1937 e 1957, foi pesquisador do Instituto Biológico de São Paulo, onde descobriu um novo princípio ativo, batizado de bradicinina (brady = lento e kinesia = movimento), que serviu de base ao desenvolvimento de medicamentos anti-hipertensivos. A comunicação da descoberta da bradicinina foi publicada em 1949 no número inaugural da revista Ciência e Cultura, da recém-fundada Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC). Foi publicada também no American Journal of Physiology, o que lhe rendeu notoriedade internacional devido ao impacto desse trabalho na fisiologia. No campus de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo, onde foi professor de 1957 a 1981, desenvolveu um centro de pesquisas de farmacologia e bioquímica.

Um dos fundadores da SBPC, defendia a bandeira da ciência pura (entendida como ciência experimental) e o alinhamento pesquisa-ensino nas universidades. Acreditava na cultura científica como via de desenvolvimento e progresso e fazia campanha por mais recursos e reconhecimento para a atividade científica no Brasil.

Carlos Vogt

Carlos Alberto Vogt, nascido em 1943, linguista e doutor em ciências pela Universidade Estadual de Campinas, foi reitor dessa universidade entre 1990 e 1994, presidente da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo de 2002 até 2007 e secretário de Ensino Superior do Estado de São Paulo entre 2007 e 2010. Professor titular na área de semântica argumentativa, coordenador do Laboratório de Estudos Avançados em Jornalismo e diretor de redação da revista de divulgação científica ComCiência, a ênfase de Vogt é na comunicação e a difusão do saber.

Vogt incorpora a dimensão sociológica e antropológica no estudo da cultura científica e mostra como são limitadas e problemáticas as noções usuais de “alfabetização científica”, “popularização/vulgarização da ciência” e “percepção/compreensão pública da ciência”.

Leia em HCS-Manguinhos:

Variações sobre a “cultura científica” em quatro autores brasileiros, artigo de Marina Assis Fonseca e Bernardo Jefferson de Oliveira

Miguel Ozório de Almeida e o projeto de uma ‘história científica e cultural da humanidade’, artigo de Maria Rachel Fróes da Fonseca e Marcos Chor Maio

“Anything goes”?: o diálogo implícito de Paul Feyerabend com dois pesquisadores brasileiros, Maurício da Rocha e Silva e Newton Freire-Maia, artigo de Francisco Inácio Bastos

Universidade, pesquisa e educação pública em Anísio Teixeira, artigo de Libânia Nacif Xavier

Acesse o sumário da edição de HCS-Manguinhos (vol.22, no.2, abr./jun. 2015)

Como citar este post [ISO 690/2010]:
A cultura científica. Blog de História, Ciências, Saúde – Manguinhos. [viewed 28  May 2015]. Available from: http://www.revistahcsm.coc.fiocruz.br/a-cultura-cientifica/