Guerra e loucura: o discurso dos psiquiatras brasileiros sobre os refugiados europeus do pós-guerra

Março/2023

Imagem: Revista de Imigração e Colonização, ano VIII, n. 1, p. 56, mar. 1947. Acervo SEADE.

O interesse da psiquiatria pela saúde mental dos imigrantes ganhou ênfase nos anos 1940, quando o Brasil recebeu milhares de refugiados e deslocados de guerra (displaced persons) do Leste Europeu após a Segunda Guerra Mundial.

No debate sobre o “imigrante ideal”, os psiquiatras argumentavam que os displaced persons eram “indesejáveis” devido à predisposição à loucura ocasionada pelos traumas da guerra, o que comprometeria sua capacidade laboral e a saúde das gerações seguintes através da transmissão hereditária das doenças mentais.

No artigo A imigração no discurso médico-psiquiátrico brasileiro no pós-Segunda Guerra Mundial, publicado na revista História, Ciências, Saúde – Manguinhos (v. 29, supl., dez/2022), Guilherme dos Santos Cavotti Marques e Carolina da Costa de Carvalho, pesquisadores do Centro de Memória da Imigração da Ilha das Flores, da Uerj, analisam artigos publicados em revistas médicas e de imigração nos quais psiquiatras defendiam critérios de seleção e controle imigratórios pautados na saúde mental, pois consideravam os refugiados europeus “imigrantes indesejáveis” devido aos traumas da guerra.

Embora o debate sobre saúde e imigração seja largamente conhecido pela historiografia das ciências, o artigo demonstra que o interesse da psiquiatria pela imigração na década de 1940 estava relacionado à busca de legitimação junto aos órgãos de seleção e controle imigratórios. Para tanto, defendiam a adoção de critérios de seleção e controle imigratório que considerassem aspectos da saúde mental dos estrangeiros que apenas o psiquiatra, enquanto especialista, poderia diagnosticar, a exemplo da elaboração de um exame médico-mental da Liga Brasileira de Higiene Mental proposto ao Conselho de Imigração e Colonização em 1947.

Segundo os autores, em diálogo com trabalhos que abordam as relações entre imigração e loucura, sobretudo em hospitais psiquiátricos, como os de Scotti (2013), Marinho e Telarow (2014) e Silva (2017), a originalidade do artigo está em focar na circularidade do discurso psiquiátrico sobre imigração na imprensa, através da análise de artigos publicados por especialistas nas revistas médicas Arquivos Brasileiros de Higiene Mental e Arquivos Brasileiros de Neuriatria e Psiquiatria e a repercussão desse debate na Revista de Imigração e Colonização.

Leia na revista HCS-Manguinhos:

A imigração no discurso médico-psiquiátrico brasileiro no pós-Segunda Guerra Mundial, Guilherme dos Santos Cavotti Marques e Carolina da Costa de Carvalho (História, Ciências, Saúde – Manguinhos, v. 29, supl., dez/2022)

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