Julho/2013
A Sociedade Brasileira de História da Educação divulgou manifesto contra o Projeto de Lei 4699/2012 – que regulamenta a profissão do historiador. A entidade considera a proposta arbitrária. De acordo com o manifesto, ao fixar a titulação em história como condição sine qua non para o exercício do ofício de historiador (inclusive da educação), a proposta nega aos educadores por titulação a possibilidade da narrativa da sua própria história, a partir de temas e questões que afetam a área e também as suas vidas.
Veja o documento na íntegra:
Manifesto da Sociedade Brasileira de História da Educação contra o Projeto de Lei 4699/2012, que regulamenta a profissão do historiador
A Sociedade Brasileira de História da Educação entende que o Projeto de Lei 4699/2012 – que regulamenta a profissão do historiador – deva ser analisado não apenas pelo que enuncia como salvaguarda ao exercício profissional de historiadores, mas, especialmente, pelo que exclui quando propõe impedir-se a atuação de pesquisadores não diplomados em História que se dedicam à investigação histórica, exercendo a imprescindível interface da educação com outras áreas de conhecimento.
O caso dos historiadores da educação, cujo exercício profissional encontra-se cerceado na forma atual do projeto de lei, torna-se especialmente emblemático da arbitrariedade proposta, na medida em que, no Brasil, a gênese e o desenvolvimento da história da educação remontam aos cursos de formação de professores que, historicamente, têm predominado como lugares de produção do ensino e da pesquisa da/na área de reconhecido mérito. Como expressão da tradição consolidada tanto no ensino como na pesquisa histórica em educação, destacamos a existência de cursos de mestrado e doutorado em diferentes programas de pós-graduação em educação de universidades brasileiras, que servem de base à produção de estudos e pesquisas cujos resultados têm sido veiculados por meio da escrita de dissertações e teses, do Congresso Brasileiro de História da Educação – cujas duas últimas edições (em 2010 e 2013) inscreveram mais de mil participantes cada-, de congressos regionais de história da educação, do Congresso Luso-Brasileiro de História da Educação, de grupos de pesquisa consolidados em redes nacionais e internacionais e de importantes periódicos.
Trata-se, portanto, de uma expressiva comunidade acadêmica solidamente estabelecida, cuja formação e cujo investimento em pesquisa acham-se profundamente enraizados na área de educação, ainda que em interface com a História. A disciplina História da Educação, para exemplificar, tem o seu nicho principal nos cursos de formação de professores, podendo aparecer como optativa em outros cursos (inclusive de História). Da mesma forma, cursos de mestrado e doutorado da área de educação têm sob a sua responsabilidade a formação específica de historiadores da educação.
Embora os argumentos da Sociedade Brasileira de História da Educação e de outras sociedades científicas tenham sido reiteradamente apresentados aos representantes da ANPUH por ocasião da formulação do PL, e embora, em princípio, alguns colegas tenham negado qualquer intenção excludente, na prática observa-se que – em nome de uma aparente “reserva de mercado”- o projeto em trâmite acaba por atropelar uma longa tradição de investimentos acadêmico-científicos em torno da constituição do campo da história da educação, bem como de outros campos igualmente relevantes na cena acadêmica brasileira.
Pelo exposto, a SBHE se junta às entidades congêneres – manifestando-se igualmente contrária à aprovação dos termos da PL 4699/2012 – ao mesmo tempo em que convida os senhores congressistas, assim como os colegas historiadores, a uma profunda reflexão sobre as implicações não apenas de ordem política e profissional, mas também de ordem epistemológica do projeto em pauta. Em outras palavras, fixar a titulação em história como condição sine qua non para o exercício do ofício de historiador (inclusive da educação), significa negar aos educadores por titulação a possibilidade da narrativa da sua própria história, a partir de temas e questões que afetam a área e também as suas vidas. Pensamos que esta exclusão seria um desserviço prestado à história, à educação e especialmente à história da educação que, cada vez mais, necessita transitar pelas interfaces das tramas complexas que a constituem, sem, no entanto, perder de vista o lugar histórico e epistemológico de onde fala e se produz.
Fonte: Jornal da Ciência
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