Germana Barata: redes sociais são excelente estratégia para revistas científicas ampliarem seus públicos

Fernanda Marques e Roberta Cardoso Cerqueira * | Portal de Periódicos Fiocruz

Germana Barata

Germana Barata

Editora do blog Divulga Ciência, Germana Barata transita por várias áreas do conhecimento, com um grande objetivo: fazer da comunicação científica um instrumento de diálogo com a sociedade. Formada em biologia, com mestrado e doutorado em história social pela Universidade de São Paulo (USP), ela atua como pesquisadora em divulgação científica do Laboratório de Estudos Avançados em Jornalismo da Universidade de Campinas (Labjor/Unicamp). Quando estudou jornalismo científico, lamentava não ver as revistas científicas brasileiras como fonte de informação no jornalismo. Atualmente, Germana coordena um projeto de pesquisa financiado pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp, que investe na comunicação de periódicos científicos brasileiros, a fim de mudar a cultura de comunicação para pares das revistas especializadas.

Portal de Periódicos Fiocruz: Considerando sua experiência no blog Divulga Ciência, fruto da pesquisa “Os periódicos científicos brasileiros: estratégias para expandir e melhorar a comunicação com a sociedade”, que fatores você elencaria como essenciais para que as revistas científicas alcancem estes objetivos?

Germana Barata: As revistas científicas estão, cada vez mais, se envolvendo com práticas de divulgação científica, pois assim conseguem ampliar o seu papel – que tradicionalmente era o de comunicar apenas para pares. Essas práticas permitem que os periódicos ganhem mais visibilidade e conquistem mais públicos. Para que consigam melhorar a comunicação, as revistas precisam estabelecer que esta é uma prioridade – o que pressupõe ter alguém dedicado a esta função.

As redes sociais, por exemplo, são uma excelente estratégia para atingir um público amplo e chegar tanto a leitores assíduos quanto a interessados numa ou outra postagem compartilhada por um “amigo”. A indicação de um amigo é a melhor forma para trazer bons leitores, mas a comunicação deve ser frequente, relevante e interessante.

Usar os canais de comunicação institucionais (sites, revistas, portais, jornais, rádio, TV etc.) que hospedam as revistas também é importante, porque muitas vezes – com verbas limitadas –as revistas não poderão contratar um jornalista ou serviço de comunicação. Lembro que há assessores da própria instituição que às vezes desconhecem os conteúdos ou mesmo a existência das revistas científicas.

Além da própria equipe editorial, é importante que os autores recebam orientações sobre como selecionar um artigo com mais apelo jornalístico, que mereça ampla divulgação (por exemplo, junto à grande mídia), e outros de relevância acadêmica (que valem uma postagem nas redes sociais, no blog da instituição ou do SciELO, na newsletter ou para leitores específicos).

Devido à multidisciplinaridade, as revistas científicas cada vez mais devem chegar a públicos de outras áreas do conhecimento. Por exemplo: alguns artigos da Revista Brasileira de Educação Física e Esportes da Universidade de São Paulo (RBEFE/USP) podem interessar não só a educadores físicos e atletas, mas a enfermeiros, fisioterapeutas, médicos, psicólogos etc. Em suma, para uma boa comunicação é preciso que os profissionais de comunicação (editor, jornalista, assessor etc.) e os autores estejam em sintonia e disponíveis.

PP Fiocruz: Os indicadores de um artigo nem sempre se traduzem numa reflexão mais aprofundada sobre um tema ou numa mudança direta quanto ao objeto/problema de pesquisa. Ao mesmo tempo, há uma crescente preocupação com a divulgação dos conteúdos das pesquisas para um público mais amplo e diversificado. Que estratégias você recomendaria para aliar visibilidade à produção científica a uma efetiva apropriação do conhecimento pela sociedade?

Germana Barata: É preciso refletir: todo artigo científico deve ser divulgado? Como comentei, uma das formas de valorizar a revista científica é que o(s) editor(es) selecionem um ou dois artigos por edição que serão divulgados seja porque despertam interesse do ponto de vista acadêmico ou social. Acredito que hajam temas mais relevantes para a sociedade. Por exemplo, escolhi o artigo “First report of autochthonous transmission of Zika virus in Brazil”, publicado na revista Memórias do Instituto Oswaldo Cruz para noticiar no blog Divulga Ciência, projeto que coordeno. Se olharmos o sumário daquela edição, veremos que nem todos os artigos são interessantes do ponto de vista jornalístico, porque são muito pontuais, regionais, técnicos etc. À época da divulgação, já havíamos atentado para a relevância do Zika vírus, que tinha entrado no país sem provocar grandes preocupações. O tema só ganharia destaque em outubro de 2015 com as primeiras suspeitas da possível associação com o aumento no número de casos de microcefalia. Hoje, este é o papercom mais citações na revista e um dos que mais atenção social recebeu segundo a pontuação do Altmetric(173).

Em outros casos, é possível colocar na pauta social temas relevantes e que podem ganhar visibilidade em função de alguma data especial, como no Dia Internacional das Mulheres em que divulgamos no Facebook o artigo “A produtividade científica tem sexo? Um estudo sobre bolsistas de produtividade do CNPq”, uma análise evidenciando que, apesar dos avanços nas ofertas dessas bolsas nos últimos anos, os homens ainda são fortemente beneficiados. Publicado na última edição dos Cadernos Pagu, o artigo recebeu um grande número de visualizações. Em outras palavras, para aliar divulgação com visibilidade é fundamental que o artigo seja relevante e interessante.

PP Fiocruz: Apesar do debate e dos avanços na comunicação da ciência, muitas vezes o modelo emissor-receptor ainda é repetido. Como atuar para que os portais de periódicos não sejam apenas um espaço onde se oferta conhecimento científico, mas sim um ambiente de trocas de saberes?

Germana Barata: Os periódicos científicos iniciaram sua história há 350 anos e sua missão de ser um veículo de comunicação entre pares mudou pouco no período. Sem dúvida, houve um aperfeiçoamento e os periódicos científicos ganharam prestígio, transformando-se em peça-chave nas definições de acesso a recursos e status na carreira, com impacto nas decisões sobre o quê é e quem tem prioridade academia, mesmo considerando as diversas limitações dos periódicos. Nos últimos anos, a internet e a chamada Era da Informação estão revolucionando a forma e o papel das revistas científicas. A rapidez e o contato direto com o público leitor (especialista ou não) promovem um feedback veloz que permite entender os motivos que levam um paper a ser mais lido e a reação dos leitores – e, com isso, traçar sua relevância acadêmica e/ou social. Hoje em dia, as revistas têm a oportunidade de participar de debates atuais, estimulando-os e até de se posicionar a partir de resultados de pesquisas, que podem ser benéficos para a sociedade e os tomadores de decisão. Tomemos como exemplo o aumento de casos de infecção por Zika vírus, o desastre que ocorreu em Mariana (MG) ou as reações populares nas redes sociais sobre “retorno à ditadura”. Revistas da área de saúde pública, como os Cadernos de Saúde Pública ou a Revista de Saúde Pública USP; ou revistas como oBrazilian Journal of Geology e Ambiente & Sociedade; além da Revista Brasileira de História e Revista de Sociologia e Política poderiam tanto sugerir a leitura de artigos de edições passadas sobre os temas, como convidar um editor ou autor para uma entrevista a ser divulgada no calor dos fatos. E ainda: sugerir um dossiê sobre os temas, de modo que uma revisão e análises científicas mais recentes sobre os acontecimentos possa contribuir para que o conhecimento científico chegue rapidamente à sociedade. Ou seja, exercemos um papel absolutamente relevante, que agrega muito às publicações.

PP Fiocruz: A altmetria já é bastante utilizada como um índice que pode colaborar na avaliação qualitativa de revistas científicas. Como os periódicos pode fazer melhor uso das redes sociais?

Germana Barata: Ao avaliar o uso de redes sociais por revistas científicas brasileiras, percebemos que embora várias delas já tenham páginas no Facebook – observando apenas a rede social mais popular no Brasil – poucas são ativas, ou seja, publicam regularmente. Dentre as que têm postagens frequentes, há revistas com milhares de seguidores, porém com baixo engajamento (curtidas, comentários ou compartilhamentos). Isso indica que faltam estratégias de comunicação para alavancar a visibilidade da revista e o interesse do público. Por exemplo, em vez de divulgar um artigo “automaticamente”, só com o título, autores e link, é importante inserir imagens (postagens com imagens tendem a ter mais engajamento), uma análise ou comentário mais pessoal e direcionado, indicando que há uma pessoa disponível para interagir com o público. Entrar nas redes sociais diariamente é fundamental, assim como responder aos comentários, críticas e elogios rapidamente. Bons exemplos são as fanpages da Revista Brasileira de Educação Física e Esportes (RBEFE) e da História, Ciências, Saúde – Manguinhos, que possuem milhares de seguidores e bom engajamento.

Muita gente pensa que estar nas redes sociais é simples e barato, sem saber que exige esforços de equipe, estratégias e bastante trabalho. Um exemplo bacana é o tutorial do nosso projeto, que divulgamos no blog, e o Manual de Políticas de Uso de Rede Social, que a RBEFE desenvolveu e compartilhou.

PP Fiocruz: Como você avalia a iniciativa da Fiocruz de criar um Portal de Periódicos? Por favor, comente sobre a importância dos portais de periódicos, considerando o perfil da instituição.

Germana Barata: Os portais de periódicos são um meio importante para valorizar as publicações de uma instituição, lembrando que às vezes a própria comunidade daquela instituição desconhece suas publicações. Segundo o Instituto Brasileiro de Informação em Ciência e Tecnologia (Ibict) existem mais de 60 portais de periódicos. Porém, o Portal de Periódicos Fiocruz tem o diferencial de cuidar da parte de divulgação das sete revistas que agrega, não só com notícias sobre os artigos, mas enfatizando temas que julga relevantes para a comunidade acadêmica e a sociedade em geral – sobretudo se consideramos que o portal congrega publicações da área de saúde pública, que são de grande interesse público e governamental.

As revistas e as instituições científicas precisam assumir sua importante missão de levar conhecimento de forma rápida e também de estabelecer o diálogo com a sociedade, buscando compreender suas demandas, críticas e contribuições públicas para garantir que o conhecimento seja voltado para melhorar nossas vidas.

* Fernanda Marques é assessora de comunicação da Editora Fiocruz.

Roberta Cardoso Cerqueira é editora executiva da revista História, Ciências, Saúde – Manguinhos e editora convidada do Portal de Periódicos Fiocruz.

Fonte: Portal de Periódicos Fiocruz

Leia em HCS-Manguinhos:

A ciência e seus públicos – Suplemento temático. Volume 20, nov. de 2013.

Leia no Blog de HCS-Manguinhos:

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Desafios aos editores da área de humanidades no periodismo científico e nas redes sociais: reflexões e experiências, artigo de Jaime L. Benchimol, Roberta C. Cerqueira e Camilo Papi em Educação e Pesquisa (v. 40, n. 2, abr./jun. 2014)

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